O direito a existir e à afirmação
“Isto é África”! Esta é a frase que ouvimos repetidamente na interacção com muitos angolanos, e ilustra o ambiente mental em que se vive neste País.
Esta imagem traduz a visão que os angolanos têm de si mesmos, e da nossa vida enquanto espectadores da construção e gestão deste País a que chamamos Angola nossa Terra.
Depois de noticiadas centenas de mortes no Iraque, no Líbano ou em Moçambique, eis que surge uma notícia que compensa tudo isto: teremos eleições em 2008. Estas garantem um futuro risonho aos angolanos, pelo que todo o resto acontece lá fora e não aqui, assim, vivam a Vossa vida serenamente e em Paz.
Mas será isto que todos queremos?
A frase, “isto é África”, engloba tudo e apaga a relevância ou realidade crua e dura, desta terra e desta gente!
É uma afirmação despida de conteúdo e esperança motora, orientada para a dinâmica do desenvolvimento.
A sua semântica esconde subtilmente a carga pejorativa que transporta, originando a resignação, ou seja, “isto é África” pertence naturalmente à vida como todas as outras condições e estados.
Isto é pouco, muito pouco para quem quer ter o direito a existir, a ser filho do mesmo Deus e da mesma Pátria, esta de que hoje tanto se fala: Angola.
Com efeito a existência serena e individual não chega a vir à tona social. O que é a vida hoje em Angola?
Nisto, como em muitos outros aspectos, prolongamos hoje o período anterior à Pré-democracia em que vivemos. Falta-nos acção, afirmação e vontade de termos direito a existir, para que o indivíduo “ganhe” autonomia e consciência do seu existir.
O discurso político domina a vida dos angolanos e a existência individual, passa pelo colectivo que estrutura ou define o poder político.
Assim, vivemos como que num cacimbo em que as consciências se passeiam e existem, isto porque o erro, a negligência ou a incompetência não agridem a nossa e as outras consciências.
Tudo, ou quase tudo, passa com uma insustentável leveza de responsabilidade, e o direito a existir pode transformar-se em pesadelo. Mas, é necessário que se assuma a liberdade, esse bem que nos doado em 75.
Nesta sociedade, como noutras, a reverência, o medo e a inacção perante homens do poder e instituições, não foram ainda tocados, de forma substantiva, por novos valores como a expressão da liberdade e o direito à afirmação do individual.
É esta atitude que impede a crítica, esse grande motor do progresso científico e social. É que, a investigação e o desenvolvimento científico apoiam-se na discussão, no confronto de ideias e na formulação de modelos, o que implica liberdade de opinião e pensamento, mas também e naturalmente, responsabilidade individual e social.
Sem investigação e o consequente conhecimento dos mecanismos políticos, sociais, culturais e jurídicos que lhe estão subjacentes não há consolidação democrática, pois como afirmam alguns autores, a justiça é o principal pilar da democracia. A justiça lato sensu, no acesso à habitação, ao trabalho, à saúde, etc.
A nossa sociedade é mais livre do que em 1992? Certamente que sim. Mas é importante que possamos existir na diferença de pensamento, de conceitos e na afirmação do colectivo e do individual.
Estamos certos de que os angolanos interiorizaram melhor as regras mínimas que definem a democracia, pelo que importa que exerçam os seus direitos democráticos e de cidadania.
Só assim poderemos afirmar a nossa diferença social e cultural.
A terminar, diria que não está subjacente ao explicitado, nenhuma visão derrotista, antes, apoiado na intensidade de uma relação emocional com este meu País, o olhar para o que envolve em cacimbo a força do direito, deste Povo, a existir livre e respeitado.
Compete aos nossos líderes políticos e de opinião, a construção do espaço pedagógico que permita aos angolanos que o direito a existir e à afirmação se constitua como um valor natural nesta terra.
Isto tem que continuar a ser África mas pelas boas razões, pela referência em matéria de equidade e bem-estar social, pela diferença cultural, pela cultura empresarial e pela afirmação no contexto global como a referência africana que o mundo precisa!
esta Angola pode ser outra! Melhor!
VAMOS SER ESTA FORÇA TRANQUILA DE QUE O PAÍS PRECISA E OS NOSSOS LÍDERES NECESSITAM!
*- COMENTÁRIO DE UM MALANJINO ANÓNIMO.
Bem vindo ao espaço de reflexão sobre uma Angola Solidária. Espero que continue a deixar os seus contributos !.
Desenvolvimento solidário. Não poderia estar mais de acordo, aliás, penso que este será o sentimento da maioria dos angolanos, com as preocupações e objectivos aqui apresentados. Solidariedade, descriminação positiva, desenvolvimento sustentado, são os grandes princípios orientadores do desenvolvimento de um país e condição absoluta, para que esse desenvolvimento seja um factor de paz social e engajamento dos cidadãos. Engajamento que assume especial importância num país como o nosso, com uma história de autodeterminação recente e com uma guerra prolongada, com todas as consequências daí resultantes. A adopção de critérios de investimento, nomeadamente no interior, cuja valoração deve ser o da discriminação positiva, podem ser a solução, ou parte, dos graves problemas que Luanda atravessa. A especulação imobiliária, os baixos salários e o crime a que Luanda está sujeita, não são mais do que consequências da falta de investimento nas províncias. Os cidadãos, despidos dos meios essências para a sua sobrevivência, nomeadamente saúde, educação e emprego, vêem-se obrigados a migrar para a capital, onde esperam encontrar a oportunidade que nas suas zonas de origem não vislumbram. Este sonho, rapidamente se transforma em pesadelo, pois constatam a não existência de oportunidades, a exploração, pelo excesso de oferta de mão-de-obra e a ausência de condições de habitação.É certo que algumas medidas foram já tomadas pelo executivo no sentido de minorar esta questão. Refiro-me nomeadamente, à lei do investimento que estabelece benefícios fiscais aliciantes para os investimentos feitos no interior do país. É de facto um princípio, embora insuficiente, pois para que este seja mobilizador dos potenciais investidores, impõe-se que o estado invista rapidamente na recuperação das vias de comunicação, saúde e ensino. O elevado número de mutilados e de excluídos, consequência do longo período de guerra, deverão igualmente ser alvo de uma atenção especial por parte do poder politico, no sentido da sua integração com dignidade na sociedade.A criação de incentivos à criação de empresas pelos cidadãos nacionais, deve também merecer atenção especial por parte do poder político, potenciando assim a produção nacional e a criação de postos de trabalho. A agricultura, sector fundamental para a auto-suficiência de um país, com a tradição rural do nosso, deve igualmente ser alvo da atenção dos nossos dirigentes. Este é o momento para enquanto parte da sociedade civil assumirmos uma atitude pró activa, incentivando assim os actores políticos a apresentarem as suas propostas/compromissos para a governação do nosso país.Enquanto cidadãos livres, politicamente conscientes e pró activos aqui estamos prontos para o debate.
Malanjino
29 de Março de 2008 19:13